Bolsonaro disse que não podia comparecer, porque tinha outro compromisso e mandou em seu lugar o vice Hamilton Mourão.
Na mesma semana em que a Câmara dos Deputados aprovou a legalização dos jogos com o apoio da base do governo e que a RĂșssia iniciou a invasão militar à Ucrânia, o presidente Jair Bolsonaro se dedicou a espalhar no WhatsApp uma notĂcia falsa sobre o ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Na madrugada da Ășltima quarta-feira, Bolsonaro compartilhou com os seus aliados um vĂdeo que distorce uma fala de Barroso a respeito do voto impresso. A gravação editada é, na verdade, uma fake news antiga que jĂĄ circulou nas redes bolsonaristas antes de a proposta do voto impresso ser rejeitada em votação no plenĂĄrio da Câmara dos Deputados.
Em julho de 2021, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) soltou uma nota para desmentir o conteĂșdo falso da mensagem, que foi agora encaminhada do celular pessoal do presidente. "Um vĂdeo, sem contexto e editado, tem circulado nas redes sociais insinuando que o atual presidente do TSE era a favor do voto impresso naquele ano. Essa afirmação é falsa", esclareceu o tribunal.
"O comentĂĄrio tirado de contexto foi feito durante a apresentação de um novo protótipo da urna eletrônica, em maio de 2017, quando Barroso e outros ministros do TSE manifestaram opiniões sobre o equipamento. Naquela ocasião, o ministro disse que o voto impresso é um retrocesso, mas ressaltou que a Justiça Eleitoral deveria se adequar e fazer o processo eleitoral sempre da melhor forma possĂvel", complementou o Tribunal.
Naquela época, um novo modelo de urna foi apresentado porque a Lei 13.165/2015 determinava a impressão do voto após ele ser registrado eletronicamente. A medida, no entanto, foi derrubada pelo Supremo em junho de 2018, com o voto, inclusive, de Barroso.
Procurado, o ministro do STF afirmou por meio de sua assessoria que o caso jĂĄ foi esclarecido pelo TSE - "vĂdeo editado e fora do contexto" - e que ele "sempre foi a favor do sistema eletrônico de votação". A assessoria do presidente ainda não se pronunciou.
A montagem foi divulgada pelo presidente no dia seguinte à cerimônia de posse do novo presidente do TSE, Luiz Edson Fachin, substituto de Barroso, que no discurso da posse cobrou respeito às urnas. Convidado para prestigiar o evento, Bolsonaro disse que não podia comparecer, porque tinha outro compromisso e mandou em seu lugar o vice Hamilton Mourão.
Nos bastidores, ministros do STF comentaram que o clima é de mal-estar com o presidente, e vice-versa. Nos Ășltimos dias, a animosidade entre os dois lados elevou o grau de efervescĂȘncia a ponto de contaminar até ministros do governo que pregavam a trégua. É o caso do ministro da Secretaria-Geral da PresidĂȘncia, general Luiz Eduardo Ramos, que, no mesmo dia da divulgação do vĂdeo pelo presidente, usou um evento oficial no PalĂĄcio Planalto para fazer duras crĂticas a ministros do TSE, sem citĂĄ-los pelo nome.
— Quando autoridades investidas em um poder desses começam a falar, a se expressar, com esse tipo de pronunciamento, me dĂĄ o direito de levantar dĂșvidas com relação à isenção e imparcialidade nos futuros processos — disse Ramos. Ele se referia a falas recentes feitas por Barroso e Fachin, que irritaram o presidente.
No inĂcio de fevereiro, Barroso declarou que os dados do TSE vazados por Bolsonaro "auxiliam milĂcias digitais e hackers de todo o mundo que queiram invadir nossos equipamentos". Fachin, por sua vez, afirmou que vinha recebendo alertas de possĂveis ataques cibernéticos, cuja "RĂșssia é um exemplo dessas procedĂȘncias", na mesma semana em que o presidente visitava o Kremlin, em Moscou.
Na Ășltima semana, Fachin ainda anunciou que a sua prioridade à frente do TSE serĂĄ combater as "distorções factuais e teorias conspiratórias" que "intentam" contra a Justiça Eleitoral.
Além dos discursos dos ministros, Bolsonaro estĂĄ se sentindo pressionado com um inquérito que o investiga por divulgar fake news sobre as urnas eletrônicas. Em dezembro, a Procuradoria-Geral da RepĂșblica considerou que "hĂĄ indĂcios" de "divulgação indevida de informações falsas e/ ou de baixa confiabilidade" durante uma live realizada pelo presidente, em julho de 2021. Um mĂȘs depois, a PolĂcia Federal afirmou que viu crime da parte do presidente na divulgação de "um inquérito policial que deveria permanecer em segredo" relacionado a um suposto ataque ao sistema da corte eleitoral.
A retomada dos ataques do presidente ocorre trĂȘs meses depois de Bolsonaro afirmar que a polĂȘmica em torno das urnas eletrônicas era "capĂtulo encerrado" e que ele "passou a acreditar no voto eletrônico" - a declaração ocorreu no mesmo momento em que Barroso havia criado uma comissão externa para acompanhar o funcionamento do processo eleitoral, com a participação das Forças Armadas, PolĂcia Federal, Congresso, OAB, Ministério PĂșblico e universidades.
O presidente, no entanto, voltou a lançar dĂșvidas sobre a credibilidade do sistema eleitoral no inĂcio de fevereiro e tem intensificado as crĂticas desde então.
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